A Família no contexto da Epilepsia Pediátrica: Resultados e Processos de Adaptação de Crianças com Epilepsia e seus Pais [concluído]
The Family within the of Pediatric Epilepsy: Adaptation Process and Outcomes in Children with Epilepsy and their Parents [concluded]

Resumo  |  Abstract

Nos países ocidentais, a epilepsia afeta entre 0.5 a 1% das crianças, acarretando desafios acrescidos não só para a criança, como para toda a família. Viver com a epilepsia significa ter de lidar com a imprevisibilidade das manifestações e curso de uma doença que permanece invisível a maior parte do tempo, e que continua associada a um forte estigma social. Crianças com epilepsia e seus pais apresentam um risco acrescido de problemas de adaptação, porém, os resultados no contexto desta condição crónica apresentam uma grande variabilidade. Ancorada no modelo socioecológico de adaptação e mudança, a presente investigação teve como objetivo compreender a adaptação de crianças com epilepsia e os seus pais. Mais especificamente pretendeu-se: (1) organizar a diversidade de resultados de investigação em torno da adaptação de crianças com epilepsia e seus pais a partir do referencial socioecológico; (2) analisar as caraterísticas psicométricas da versão portuguesa da Iowa-Netherlands Social Comparison Scale (INCOM), uma medida de orientação para a comparação social, com pais de crianças com condições crónicas de saúde pediátricas; (3) comparar famílias no contexto da epilepsia com famílias no contexto de outras condições crónicas de saúde pediátricas (asma, diabetes e obesidade), ao nível da adaptação individual e de variáveis do funcionamento individual e familiar; (4) analisar o papel de fatores familiares, parentais, individuais e clínicos, nos resultados da adaptação das crianças e dos seus pais, bem como examinar mecanismos explicativos específicos através dos quais estes fatores exercem a sua influência.

 

O desenho metodológico da investigação integrou uma fase preparatória, da qual resultou um estudo de revisão de literatura, seguida de duas fases empíricas quantitativas independentes de natureza transversal, uma que integrou famílias com crianças com epilepsia, asma, diabetes e obesidade (N=301 famílias), e outra composta exclusivamente por famílias com crianças com epilepsia (N=221).

 

Os resultados dos estudos psicométricos da INCOM apoiaram uma solução fatorial unidimensional que se revelou fiável e válida na avaliação da orientação para a comparação social em pais de crianças com condições crónicas pediátricas. Os resultados do estudo comparativo permitiram disputar a ideia de que a epilepsia é a condição com pior impacto no funcionamento familiar e nos indivíduos. Dos quatro grupos clínicos, foram as crianças com diabetes e obesidade que apresentaram níveis mais baixos de QdVRS. No contexto específico da epilepsia pediátrica, a presente investigação permitiu clarificar o papel dos recursos familiares globais na adaptação de crianças e pais e respetivos mecanismos de influência. Mais concretamente, independentemente do NSE da família, grupo etário da criança e nível de gravidade da epilepsia, os resultados revelaram que: maior coesão familiar  associou-se a níveis inferiores de estigma, em crianças e em pais; a coesão familiar contribuiu para melhor adaptação de crianças e pais, por si só, e por diminuir as dificuldades na gestão familiar da epilepsia, a perceção de estigma, e por aumentar a mutualidade parental. Quanto mais os pais percebiam a família coesa, mais elevada foi a QdVRS reportada pelos filhos (efeito diádico). Maior significado dos rituais familiares associou-se a melhor adaptação (níveis inferiores de sintomatologia depressiva e/ou ansiosa e superiores de QdV) dos pais; parte desse efeito foi mediado pela competência parental. No contexto de uma gestão familiar da epilepsia percebida pelos pais como mais difícil, a orientação comparação social dos pais constituiu um fator de vulnerabilidade para níveis inferiores de adaptação nas crianças (menor QdVRS e maior perceção de estigma).

 

Os nossos resultados sugerem que mesmo que os pais/crianças não refiram abertamente preocupações em torno do estigma ou com as comparações sociais negativas, os clínicos deverão promover a discussão aberta destes temas, com pais e filhos em conjunto. Para além disso, o desenvolvimento de atuações promotoras de dimensões positivas do funcionamento familiar, alicerçadas em competências e recursos já presentes na família é passível, por si mesma, de contribuir para melhorias na adaptação de crianças e  seus pais, quer indiretamente, por diminuir as perceções de estigma em relação à epilepsia, ou as dificuldades na gestão familiar, ou por aumentar a competência e a mutualidade parental. Famílias cujas crianças e pais que apresentem marcadores de risco (menor coesão familiar, maiores dificuldades na gestão diária da epilepsia), pais com elevada orientação para a comparação social ou menor competência parental) deverão ser sinalizadas para intervenção. Globalmente, os resultados apoiam a relevância de modelos de prestação de cuidados centrados na família na área da epilepsia pediátrica e alertam para a importância de empreender esforços sistemáticos de avaliação e intervenção ao nível dos fatores familiares globais, parentais e individuais.


Epilepsy affects between 0.5 and 1% of the children in western countries. Dealing with epilepsy poses significant challenges not only for the child, but for the entire family system. Living with epilepsy means dealing with the unpredictable nature and course of a disease that remains largely invisible, and that is loaded with social stigma. Children with epilepsy and their parents are at increased risk for adaptation problems, however, the literature reveals great variability in terms of children’s and parents’ adaptation outcomes. Grounded in the socioecological model of adaptation and change, the current research project aims at understanding the adaptation of children with epilepsy and that of their parents. Specifically, the following aims were outlined: (1) organizing the diversity of findings in this area of research, by applying the socioecological framework to the context of pediatric epilepsy; (2) examining the psychometric proprieties of the Portuguese version of the Iowa-Netherlands Social Comparison Scale (INCOM) with parents of children with pediatric chronic conditions; (3) comparing families in the context of epilepsy with families in the context of other pediatric chronic conditions, at the level of children’s and parents’ individual adaptation outcomes and individual and family functioning variables; (4) analyzing the role of family, parental, individual and clinical factors in the adaptation outcomes of children and parents, as well as examining specific mechanisms through which these factors might operate.

 

Research design comprised a preparatory phase that led to a review study, followed by two independent quantitative phases of cross-sectional nature. Along with families of children with epilepsy, research phase two included families of children with asthma, diabetes and obesity (N=301). Research phase three comprised exclusively families of children with epilepsy (N=221).

 

The results of the psychometric studies of the INCOM support a unidimensional factorial solution, that was considered reliable and valid in the assessment of the social comparison orientation of parents of children with chronic pediatric conditions. The results of the comparative study challenge the commonly spread idea that epilepsy is the most detrimental condition for the lives of children and their families. Out of the four clinical groups under comparison, parents of children with diabetes and obesity reported the lowest levels of their children’s’ HRQoL. The present research enabled the clarification of the role of global family resources in the adaptation outcomes of children and parents, as well as mechanisms through which these factors operated, within the context of pediatric epilepsy. Regardless of the family´s SES, children’s age group or level of epilepsy severity: higher levels of family cohesion were associated with lower stigma, both in parents and children. Family cohesion was associated with better adaptation outcomes (QoL), both directly, for children and parents, and indirectly, by decreasing epilepsy family management difficulties and perceived stigma and by increasing parental mutuality around epilepsy management. At the dyadic level, the more parents perceived their family as cohesive, the higher was their children´s reported HRQoL. When parents reported stronger family ritual meaning, they also showed better adaptation outcomes (lower levels of anxious and depressive symptoms and higher levels of QoL), and part of this link was mediated by perceived parental competence. Within the context of perceived epilepsy family management difficulties, children of parents with higher social comparison orientation showed an increased risk of poorer adaptation outcomes (lower levels of HRQoL and higher perceived stigma).

 

Even if parents or children do not report worries regarding negative social comparisons or perceived stigma, clinicians should routinely promote open family discussions on these matters. Focusing intervention targets on positive whole-family dimensions (family cohesion and family ritual meaning), grounding efforts on what families naturally do and recognize as their own, and are amenable to change, may be a favorable route to promote better adaptation outcomes in children with epilepsy and in their parents, both directly and indirectly, by decreasing epilepsy perceived stigma and family management difficulties or by increasing parental competence and mutuality. Families showing risk markers (lower family cohesion, higher family management difficulties, parents higher in social comparison orientation) should be targeted for intervention. Overall, our results support the relevance of adopting a family-centered model of care in the area of pediatric epilepsy and the importance of routinely addressing assessment and intervention efforts in the area of whole family factors, parental and individual factors.

Data de início e conclusão  |  Date of initiation and conclusion


2012-2018

Equipa  |  Team

Investigadores Coordenadores | Coordinators

Carla Crespo

 

Joan Kessner Austin

Indiana University, United States of America

 

 

Investigador de referência | Main researcher

Teresa Mendes

Aprovação  |  Approvals

Comissões de ética e/ou conselhos de administração das unidades hospitalares envolvidas

Financiamento  |  Funding


Bolsa de Doutoramento da Fundação para a Ciência e Tecnologia (SFRH/BD/86337/2012).

Instituição  |  Institutions

Instituições de acolhimento / Host institutions


Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação - Universidade de Coimbra

 


Centro de Investigação em Neuropsicologia e Intervenção Cognitivo-Comportamental (CINEICC-FPCE-UC)

 

Instituições envolvidas / Other institutions

Conta ainda com a colaboração de diversos agrupamentos escolares e de diversas instituições públicas de saúde pediátrica:

 


Hospital Pediátrico do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC, EPE)

 


Hospital Garcia de Orta (HGO, EPE)

 


Hospital de Santo André do Centro Hospitalar Leiria-Pombal (CHLP, EPE)


Hospital Distrital de Santarém (HDS, EPE)

   

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